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Perspectiva pessoal da Volta às Terras de Santa Maria 2016

‘Quando vais para uma corrida, nunca sabes o que esperar.’ Esta frase, ouço-a desde que cheguei ao ciclismo e fiz dela a minha realidade, já que é exactamente o que sinto à partida de uma nova prova. Este fim-de-semana, de 9 e 10 de Abril, acompanhei o pelotão mais jovem das equipas de clube na 25ª Volta às Terras de Santa Maria, que significou o meu regresso à primeira prova que vivi in loco em 2013.

Nesse ano, a prova destinava-se às equipas de clube e também às equipas continentais dos profissionais do pelotão nacional, o que fez aumentar em 2016 a expectativa sobre como decorreria o ritmo, a competitividade, o desempenho dos ciclistas e forma de batalhar pela corrida. A abordagem de uma competição difere de escalão para escalão, sendo natural um maior fervilhar de emoções quando falamos de provas com profissionais. Natural, mas nem sempre é assim…


Esta 25ª edição da Volta contou com todos os ingredientes inerentes a uma grande prova de ciclismo, digna de profissionais. Em termos de organização, a cargo do Sport Ciclismo São João de Ver, deparei-me com uma preocupação extrema para estar tudo preparado a tempo e horas, quer no apoio às equipas, quer em relação ao importante tema da segurança em corrida. Todos os pontos foram avaliados ao longo dos quilómetros, sem se descurar o actual tema em foco sobre os veículos em prova. A nível internacional, os casos sobre atropelamento em corrida têm-se multiplicado derivado ao elevado número de motas em corrida. Este é um tema delicado, visto serem necessárias para divulgar a corrida [falando nos media] e para a própria segurança dos atletas [falando do policiamento]. Analiso o que vi e desse reflexo retiro um extremo cuidado por parte do comissariado no posicionamento das mesmas em consonância com o pelotão.

No tema das equipas, tivemos sete portuguesas e cinco espanholas, perfazendo um total de 99 corredores, maioritariamente sub-23. A batalha foi incessante e emocionante do primeiro ao último quilómetro. Na velocidade não se brincou nos golpes dados nos pedais, fazendo médias de 42,454 km/h na primeira etapa, 44,946 km/h no contra-relógio e 38,056 km/h no Circuito do Castelo. No plano geral, a média pedalada foi de 40,776 km/h, o que fala por si sobre a garra com que este pelotão encarou a Volta.

Não é rara a ocasião de equipas espanholas correrem em provas lusitanas. O ciclismo ibérico une-se por inúmeras vezes, mostrando que neste pequeno recanto da Europa florescem enormes talentos para o ciclismo mundial. O vencedor da 25ª edição, Luís Gomes de 21 anos, é um dos talentos lusos em pleno florescimento, que começou a dar nas vistas aquando da sua passagem em 2013/2014 pela equipa Maia, então dirigida por Joaquim Andrade. Actualmente na Liberty Seguros-Carglass [desde 2015], sob a direcção de Manuel Correia, o jovem Luís Gomes está a viver um forte início de temporada, contando com o 2º lugar na espanhola Clásica de Páscua em Padrón, 8º na geral da Clássica da Primavera com os profissionais, sendo 2º na classificação da juventude da referida prova e também 10º da juventude na Volta ao Alentejo. A vitória da Volta às Terras de Santa Maria, onde venceu a primeira etapa, finalizou em 8º no contra-relógio e 2º no Circuito do Castelo, agarrando ainda a classificação dos pontos, é uma demonstração do seu bom nível, principalmente batendo-se com corredores elites como fez nesta Volta diante de Pedro Merino de 28 anos (Supermercados Froiz), Jorge Montenegro de 32 anos (Aluminios Cortizo-CC Padrones) ou Aser Estévez de 27 anos (CC Rias Baixas). À vitória de Luís Gomes une-se o brilhantismo com que toda a equipa Liberty Seguros-Carglass se entregou de corpo e alma à luta pela conquista da Volta, mostrando-se cada elemento fundamental no desfecho vitorioso da edição.




Quanto à Moreira Congelados-Feira-Bicicletas Andrade, pessoalmente estava muito expectante quanto à forma como os pupilos de Joaquim Andrade iriam abordar a ‘prova da casa’, não esquecendo que este clube tem um enorme historial na formação de inúmeros jovens talentos elevados ao ciclismo profissional. Entrega total, luta por cada etapa, trabalho colectivo e crescendo de forma relativamente a provas anteriores foram as conclusões que retirei de todos os jovens 'Moreira'. Com Francisco Campos na primeira etapa (5º lugar), João Silva no contra-relógio (5º lugar) e André Bessa no Circuito do Castelo (7º lugar), a equipa esteve presente em todas as lutas pela vitória de etapas. Presentes igualmente na batalha pelas classificações secundárias, viram a vitória da montanha recair sobre Venceslau Fernandes, que tinha acabado de conquistar a mesma camisola na Clásica de Páscua, em Espanha. Também na juventude Francisco Campos esteve perto de agarrar a camisola branca, terminando em 3º depois de vestir esta liderança no final da primeira etapa. Em 3º por equipas, o saldo deste grupo é bastante positivo e demonstrador de como dignificaram as cores da casa.






Não podendo falar de todos os ciclistas, que na minha perspectiva se destacaram nesta prova, abordo alguns nomes. Ivo e Rui Oliveira foram dois dos elementos cruciais à vitória da Liberty Seguros-Carglass, tendo ambos uma sublime performance no contra-relógio ao finalizarem em 1º e 3º respectivamente. Acrescentaram ainda um notável desempenho no derradeiro Circuito, com Ivo a desencadear um ataque a duas voltas do final, que se mostrou crucial na luta de Luís Gomes pela geral. Também Rui não faltou à chamada, terminando o Circuito em 8º e fechando esta edição em 4º da geral.



Luís Mendonça (Sicasal-Constantinos-Udo) continua a surpreender pela forma combativa como aborda cada corrida, levando desta feita a vitória das metas volantes e sendo 13º da geral. Victor Valinho, que já se sagrou campeão nacional em júnior e em sub-23, sobressaiu no contra-relógio (7º) e no Circuito do Castelo (11º), terminando em 7º da geral e revelando um bom prenúncio para este ano de renovar de ânimo com mudança de equipa. Aliás, a sua esquadra também deu guerra nesta Volta, terminando os ‘lobos’ da GoldWin-Team José Maria Nicolau em 2º no colectivo.




No plano dos ciclistas estrangeiros, dois rostos sobressaíram mesmo não vestindo nenhuma das camisolas em jogo. O argentino conhecido do pelotão luso Jorge Montenegro (Alumínios Cortizo-CC Padrones) repetiu o 3º lugar do pódio final alcançado em Fevereiro na Volta à Maia. Nesta Volta às Terras de Santa Maria deu guerra aos mais jovens lusos, quase arrancando a vitória da primeira etapa a Luís Gomes, sendo segundo no renhido sprint pela linha de meta. Acrescentou um 4º lugar no esforço individual e 6º no circuito final.


Quanto ao outro rosto espanhol, “El Gallu” José Gutiérrez (CC Rias Baixas) continua a sua senda de bons resultados em cada competição. Um corredor que se tem destacado em lugares cimeiros este ano com o 2º lugar no Gran Premio Ciclista Cuéllar e 4º na Clásica de Páscua, duas provas pontuáveis para o Ranking da RFEC – Real Federación Española de Ciclismo, relembrando entre outros resultados que no ano passado foi 7º na Volta a Coruña e na Volta a Cantabria, venceu a combatividade na lusitana Volta ao Alto Tâmega e a geral do Trofeo Nuestra Señora del Portal, rumando em seguida para a equipa Kuwait Cycling Project, onde disputou o Sharjah Tour e a UAE Cup nos Emirados Árabes Unidos e o Tour of Al Zubarah no Qatar, no qual finalizou em 6º da geral. Na Volta às Terras de Santa Maria, “El Gallu” não só lutou pela defesa da camisola amarela do companheiro Aser Estévez, bem como esteve consecutivamente na batalha pelos lugares cimeiros, 4º na primeira etapa e 4º no Circuito do Castelo, fechando em 5º da geral.


A finalizar esta já longa perspectiva pessoal, assinalo a constante homenagem a antigas glórias do ciclismo nacional, que o Sport Ciclismo São João de Ver protagoniza a cada edição da Volta às Terras de Santa Maria, contando também com a divulgação a cada etapa das tradicionais iguarias da região, promovendo desta forma a terra que acolhe ciclismo há inúmeros anos.


Como momento curioso, para quem gosta de ciclismo e de detalhes singulares, destaco o gesto do Presidente da Federação Delmino Pereira a proteger os corredores da chuva que teimou em marcar presença no contra-relógio.



Remato com a declaração de Joaquim Andrade, director desportivo da Moreira Congelados-Feira-Bicicletas Andrade, ao Cycling & Thoughts: “Foi uma Volta com grande nível e pudera haver mais algumas assim para o nosso escalão.”





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Ver também:
* Álbum Et1, aqui
* Álbum Et2, 1º e 2º sector, aqui

Comentários

  1. Mais uma prova em que a federação omite em esconder algumas edições do seu historial...foi a edição 28 e não a 25.

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