Aos 33 anos de idade, Ricardo Mestre (W52-FC Porto) é um dos
rostos mais acarinhados e marcantes do pelotão luso. Estimado por muitos fãs do
ciclismo português, a imagem da sua vitória na Volta a Portugal de 2011 ficou
para sempre ligada ao amuleto que levou consigo a cada etapa, a chucha
cor-de-rosa da filha Lara, então com 8 meses. Já antes dessa vitória e agora
nas temporadas recentes continua a distinguir-se como o gregário de luxo no
pelotão nacional.
O caminho de Ricardo Mestre foi traçado maioritariamente no
Clube de Ciclismo de Tavira. O aperfeiçoamento do seu talento foi trabalhado na
equipa tavirense, tornando-se num dos melhores ciclistas portugueses a pedalar
em Portugal. A experiência foi cimentada ao longo de anos, sendo peça-chave na
história da Volta a Portugal ao ser o gregário de luxo de David Blanco, com
quem viveu três das cinco vitórias do talentoso galego.
Aos 27 anos alcançou o sonho de muitos ciclistas lusos,
conquistar a rainha das provas lusitanas. A 73ª edição da Grandíssima foi ganha
com mestria e um amuleto especial, a referida chucha cor-de-rosa que percorreu
consigo o prólogo e as dez etapas, essencial no triunfo do contra-relógio
individual da 7ª etapa, entre o Sabugal e a Guarda, que o conduziu à camisola amarela,
uma liderança que não mais despiu até à consagração final.
Esta doce conquista foi precedida pela vitória no Troféu
Joaquim Agostinho, um triunfo que repetiu no ano seguinte, em 2012, com a
conquista da dura chegada ao Alto da Carvoeira na derradeira etapa.
Depois dessas temporadas de glória, Ricardo Mestre rumou ao
pelotão internacional, em 2013, através da carismática equipa basca Euskaltel-Euskadi.
Desafortunadamente, a esquadra laranja fechou portas no final desse ano,
ditando o regresso de Mestre ao pelotão nacional pela equipa Efapel-Glassdrive,
em 2014, e posteriormente o retorno a Tavira, em 2015. No ano de 2016 mudou
novamente de cores, ingressando na W52-FC Porto, onde permanece até aos dias de
hoje.
Na 40ª edição do Troféu Joaquim Agostinho, o Cycling & Thoughts esteve à conversa
com Ricardo Mestre, que revelou toda a sua simpatia e humildade inerentes ao
grande ciclista que tem demonstrado ser ao longo da sua carreira.
C&T: Correr o Troféu Joaquim Agostinho tem um gosto
especial?
RM: Sim, sinto-me bem
aqui. É uma corrida que gosto de fazer, que me traz boas recordações, não só
quando ganhei, mas nos outros anos também. Sinto que é uma corrida onde o povo
está sempre bastante próximo e isso é motivador para a nossa modalidade. É com
enorme satisfação que estou cá mais um ano.
C&T: O primeiro ano em que venceste o Troféu foi
precisamente o ano da vitória da Volta a Portugal.
RM: São recordações
muito boas, que nunca vou esquecer. Mas agora venho com outras ambições, venho
testar a minha condição física. Espero estar com os primeiros, mas não em
condições de disputar a vitória. Acima de tudo, espero desfrutar da corrida e
do público.
C&T: A tua carreira teve momentos bastante marcantes e
um deles foi a passagem pela Euskaltel-Euskadi. Como viveste o fim dessa
importante equipa do pelotão internacional?
RM: Foi uma situação
complicada, tanto para mim como para toda a equipa. Foi uma coisa que ninguém
estava à espera. De repente, de um momento para o outro, soubemos da notícia e
a partir daí houve algumas negociações para a equipa tentar sobreviver, mas essa
possibilidade não se concretizou e então foi quase cada um a salvar-se como pôde.
Eu tive sempre a porta aberta no pelotão português.
C&T: Nesse ano, com a Euskaltel-Euskadi, tiveste a
oportunidade de correr uma das três grandes voltas. Que recordações guardas
desse Giro d’Italia?
RM: É uma corrida
muito bonita, bastante dura e no ano que eu fiz as condições meteorológicas
foram também bastante complicadas. Apanhámos chuva e neve praticamente todos os
dias. Se algum dia fosse possível, gostava de ir ver como espectador.
C&T: No regresso a Portugal passaste pela Efapel e pelo
regresso a Tavira, até ingressares na W52-FC Porto. Como tem sido a tua estadia
na equipa azul e branca?
RM: Tenho sido sempre
bem acolhido desde o primeiro dia. É uma equipa que me tem tratado muito bem,
tem dado valor ao trabalho que tenho realizado e isso para mim é muito
gratificante.
C&T: Este ano estiveste perto de regressar às vitórias
no Grande Prémio Internacional Beiras e Serra da Estrela, um feito que muitos
dos fãs que acompanham a tua carreira torceram para que acontecesse. O que sucedeu
naquele último dia, na etapa rainha, para não conseguires chegar à vitória da
camisola amarela?
RM: Também tenho
saudades das vitórias e de certeza que ninguém a queria mais do
que eu. Estando próximo da vitória [2º na geral a 8s], queria conquistá-la, mas há dias em que não estamos tão bem. Nós fizemos
o Grande Prémio JN e logo de seguida a corrida das Beiras foi muito disputada,
muito dura e penso que paguei pelo esforço realizado. Não foi o melhor dia.
C&T: O papel que desempenhas na equipa tem-se mostrado
de extrema importância nas vitórias da W52-FC Porto.
RM: Sempre fui ensinado
a ser assim desde as escolas de ciclismo, a trabalhar para outros ciclistas, a
viver da glória dos outros. Aqui tenho andado nesse papel. É um papel no qual
me sinto bastante à vontade e espero uns quantos anos mais conseguir fazer bem
este papel e com alguma vitória pelo meio.
C&T: A Volta a Portugal está cada vez mais próxima e tu
serás novamente uma das peças-chave da equipa. Na tua opinião, o percurso sem a
chegada à Torre e com o contra-relógio final adequa-se mais a que tipo de
ciclista?
RM: À partida, espero
estar na Volta a Portugal e apresentar-me em boa condição. Penso que, em termos
de moldes, as chegadas decisivas são as mesmas, o contra-relógio também não vai
variar muito e sendo assim os candidatos irão ser praticamente os mesmos dos
outros anos.
C&T: Sendo a W52-FC Porto a máxima favorita, quem é o maior
rival?
RM: Nós não temos
essa mentalidade na equipa de nos preocuparmos com os adversários. Vamos com o
nosso pensamento bem delineado, sabemos o que temos a fazer, sabemos quem é o
nosso líder, ou os nossos líderes, e a partir daí tentamos fazer a corrida da
maneira que nos for mais benéfica.
C&T: O ano passado venceu o Rui Vinhas, mais um gregário
de excelência. Esse facto mexeu com a cabeça dos ciclistas?
RM: Mexeu. Foi muito
bom, principalmente para o ciclismo português, que estava a precisar de um
português a ganhar a Volta. Agora, nós queremos que a vitória seja sempre
dentro da nossa equipa. À partida, temos o nosso líder definido e depois as
oportunidades, se as houver, serão aproveitadas. Mas um gregário, ao fim de
muitos anos, ter uma oportunidade que aparece… esses momentos há que agarrá-los
com unhas e dentes.
A vitória de Ricardo Mestre no Alto da Carvoeira, Troféu Joaquim Agostinho em 2012 (© Helena Dias) |
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