A 79ª edição da Volta a Portugal Santander Totta vai
para a estrada nos próximos dias 4 a 15 de Agosto. No 90º aniversário da prova
rainha do calendário lusitano, a equipa Efapel apresenta-se novamente como uma
das principais rivais a destronar o poderio demonstrado nos últimos anos pela W52-FC
Porto, detentora do título com Rui Vinhas.
A dias do início da competição, o Cycling & Thoughts entrevistou em exclusivo o director
desportivo Américo Silva, que
regressou ao ciclismo na metade do ano de 2015 para comandar a equipa
continental Efapel. Aos 52 anos de idade, persegue o objectivo de conquistar a
Volta a Portugal.
C&T: O teu regresso ao ciclismo tem como grande
objectivo de levar a Efapel à conquista da Volta a Portugal. Como tem sido a
construção desse objectivo, tendo como panorama uma W52-FC Porto que se mostra
imbatível?
AS: “Nós temos a noção daquilo que valemos e o
que valem os adversários. Sem falsas modéstias, temos sido a equipa que mais
luta tem dado à equipa W52. Nos dois últimos anos com o Joni [Brandão] e este ano com o Sérgio
[Paulinho] conjuntamente com o Henrique
[Casimiro], que desde que entrou nesta Efapel tem tido umas épocas
espectaculares. Daí eu estar a falar
nele neste momento, porque acho que lhe devo dar essa oportunidade. Conhecemos
as nossas restrições, mas independentemente disso contamos voltar a sonhar em
vencer a Volta a Portugal. O Sérgio tem tido uma evolução, da qual falei no
início da época sobre o trabalho que tinha de ser progressivo. Não era algo que
ia aparecer de um momento para o outro, tendo em conta o trabalho que ele vinha
a realizar há alguns anos nas equipas por onde passou no estrangeiro.
Felizmente, essa evolução de se tornar novamente um ciclista líder tem vindo
progressivamente a acontecer, ao ponto de ter conseguido neste Campeonato
Nacional de Contra-relógio uma prestação que muito me agradou.”
C&T: Sérgio Paulinho foi 3º no Nacional de contra-relógio e o seu valor é indiscutível. Como tem sido esse trabalho de
transformação de gregário a líder? Difícil?
AS: “Não, não é difícil. Por isso mesmo disse-o
no início da época que não podemos estar à espera de começar a ver muitos
resultados do Sérgio, porque a preparação é diferente, a mentalidade é
diferente. Essa transformação leva algum tempo a fazer. E se nós formos fazer
uma pequena retrospectiva do que aconteceu a todos os ciclistas que estiveram
no estrangeiro a fazer esse tipo de trabalho… temos o caso do Orlando, do José
Azevedo, que quando saíram de Portugal eram ciclistas ganhadores e quando
voltaram já não conseguiram ser. O Sérgio, se formos avaliar a época que fez
até esta altura, já conseguiu melhores resultados do que qualquer um dos
outros. Ou seja, na Clássica da Arrábida, na chegada ao alto esteve na
discussão da corrida e entre o ter feito 2º e ter vencido a diferença foi pequena.
Numa especialidade que já foi a sua, voltou a estar na discussão do Campeonato
Nacional de Contra-relógio, 15 segundos para o 2º classificado, que é o melhor
especialista que temos neste momento, o Rafael Reis, e 20 segundos para o 1º
lugar. Mas penso que a principal referência acaba por ser o Rafael Reis num
contra-relógio de 20 km. Vendo todos os outros contra-relógios que fez até
agora, vê-se novamente que houve uma evolução e isso é o que nos faz abrir boas
perspectivas para a Volta a Portugal, que segundo o meu ponto de vista não é uma
Volta tão dura como a do ano passado e muito menos do que há dois anos.”
C&T: O percurso da Volta deste ano está mais indicado
para que tipo de ciclista?
AS: “Eventualmente, para ciclistas que andem bem
no contra-relógio. Daí a minha satisfação de ver o Sérgio fazer 3º num
contra-relógio de 20 a 30 km, apenas a 15 segundos, tendo em conta que o último
contra-relógio da Volta é de 20 km.”
C&T: O ano passado vimos uma Efapel bastante
inconformada na estrada, sendo a equipa que mais trabalhou para evitar a
vitória da W52-FC Porto. Como se trabalha a mentalidade dos ciclistas para a
não concretização de um objectivo, pelo qual tanto trabalharam?
AS: “Há dois anos fizemos 2º e 3º na Volta a
Portugal com o Joni [Brandão] e com o [Alejandro] Marque,
dois ciclistas com características diferentes. O ano passado só tínhamos o
Joni. Ao termos só o Joni, tínhamos uma coisa clara: se queríamos ganhar a Volta,
e queríamos independentemente de saber que a Volta a Portugal não era traçada
para as características do Joni, tínhamos que chegar ao último contra-relógio
com um minuto e meio para o Gustavo Veloso. Ao fim e ao cabo, foi o que o Joni perdeu
para o Gustavo no último contra-relógio. Tudo o mais que pudesse acontecer
era-nos indiferente e daí nós termos lutado, algumas vezes até criticados, mas
pouco nos importa, com vista a esse objectivo de tentar vencer a Volta a
Portugal. Nós sabíamos duas coisas: primeiro, na Sra. da Graça cada vez menos fazem-se
grandes diferenças, no melhor dos casos 20 ou 30 segundos, o que não é o
suficiente; segundo, tendo em conta que a chegada da etapa da Torre não é no
alto da Serra da Estrela, estava tudo dito. Tínhamos que jogar de longe e foi o
que tentámos, mesmo sabendo que as probabilidades eram escassas, mas cumprimos
aquilo para o qual nos propusemos. Lutar pela Volta a Portugal, não lutar por
um lugar secundário na Volta a Portugal.”
C&T: Em relação a 2017, voltamos a não ter a chegada à
Torre. Faz assim tanta diferença?
AS: “A Torre faz. A Torre é a subida em
Portugal que mais diferença faz. Eventualmente poderão haver outros locais, que
por interesses óbvios a Volta a Portugal não faz chegadas e poderiam também fazer
diferença. Perante o panorama que é todos os anos a Volta a Portugal, a Serra
da Estrela é aquela que faz sempre as maiores diferenças conjuntamente com o
contra-relógio. Não havendo a chegada à Torre, só nos resta a Sra. da Graça e
os tais 20 ou 30 segundos entre os diversos candidatos. Normalmente, aqueles
que sobem bem tentam fazer a diferença para os que andam bem nos
contra-relógios e, depois, os contra-relogistas têm a possibilidade de inverter
essa situação de 20 ou 30 segundos perante os 20 km da última etapa mais os 5
km do prólogo.”
C&T: Fora do âmbito da Volta, o calendário teve vários
cancelamentos de provas este ano. Como vês essa situação?
AS: “Sobre o calendário nacional, se as provas
que estavam calendarizadas tivessem sido todas realizadas, é um calendário
suficiente para as equipas portuguesas. Isto em termos gerais, estando a falar
das equipas que têm mais e menos ciclistas. Nós, por exemplo, temos 9 ciclistas
e para nós era um calendário óptimo. Não temos interesses comerciais para
correr em Espanha. Eventualmente vamos a uma corrida ou outra para ter algum
contacto internacional e para os ciclistas terem a noção que têm capacidade
para se confrontar com algumas equipas estrangeiras, principalmente as
espanholas e aquelas que mais nível têm, para no caso de virem à Volta a
Portugal ou alguma competição em Portugal não nos sentirmos minimizados perante
essas equipas. O problema que existiu este ano é que as competições foram mal
distribuídas nos meses de competição, ou seja, houve aqui um interesse de
juntar a Volta ao Alentejo à Volta ao Algarve, para atrair as equipas que
estavam na Volta ao Algarve e isso acabou por não acontecer, criando um fosso
muito grande em termos de calendário sem competição. Para mim, o principal
problema foi esse. Mas é o que eu digo, se essas competições tivessem sido
realizadas e o calendário seja feito a pensar nas equipas portuguesas e não nas
estrangeiras, penso que é um calendário bastante compatível ao nosso panorama
nacional.”
C&T: Para terminar, a tua ligação com a Efapel é para
continuar nas próximas temporadas?
AS: “Normalmente, e sempre trabalhei assim enquanto
ciclista, sempre fiz contratos anuais. Isto para dar a possibilidade a mim de
sair quando não estou satisfeito e de quem não está satisfeito comigo me mandar
embora e ficamos sempre satisfeitos. Felizmente, até à altura nunca tive
problema com ninguém, as coisas têm-me corrido bem nesse aspecto, sempre saí
satisfeito das equipas onde estive e não programo as coisas a longo prazo.
Neste momento, estou satisfeito com a equipa que tenho, tanto a equipa de
trabalho como ciclistas. Quando chegarmos ao final da época, se ambos
estivermos satisfeitos as coisas continuarão. Se houver uma das partes que não
esteja satisfeita, ficamos amigos como antes e não há problema nenhum.”
Entrevista a Sérgio Paulinho, de 5 de Maio, aqui.
Equipa Efapel à partida para o GP Mortágua (© HelenaDias) |
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