“Um grande corredor, jovem, e que no
futuro vai ser um possível vencedor da Volta a Portugal”, assim descreveu Delio Fernández o companheiro
luso António Carvalho, um dos rostos mais destacados na Volta deste ano e que
se mostrou uma peça fundamental no apoio à vitória de Gustavo Veloso na prova
rainha lusitana.
António
Carvalho viveu em 2015 a primeira temporada na equipa W52-Quinta da Lixa.
Sobrinho de Fernando Carvalho, herdou do tio vencedor da Volta a perícia no
pedalar e a qualidade na montanha. O ciclismo sempre fez parte da sua vida. “Costumo
dizer que mesmo antes de nascer já estava em contacto com o ciclismo, pois toda
a minha família é muito apaixonada por esta modalidade. É raro algum membro nunca
ter corrido, só mesmo a minha madrinha e, na geração mais recente, a minha irmã.
Ainda eu não tinha 1 ano de idade e o meu tio, Fernando Carvalho, tinha vencido
a prova rainha do ciclismo nacional em 1990. Comecei aos 7 anos a realizar as
primeiras provas na equipa do meu tio, Escola de Ciclismo Fernando Carvalho,
até aos 18 anos. Pelo meio, durante um ano deixei de correr e fui para o futebol. Depois, no meu 2º ano de sub-23 fui para uma equipa espanhola, o Clube
de Ciclismo de Lugo, e quando passei ao 3º ano de sub-23 fui para o Mortágua,
onde estive três anos, o último deles como elite. De seguida, durante dois anos
representei a equipa profissional LA Alumínios-Antarte e agora estou na W52-Quinta
da Lixa.”
Aos 25 anos, António
Carvalho conta já com momentos marcantes na jovem carreira pautada desde cedo
por êxitos destacáveis. “Acho que o ponto-chave do meu actual
sucesso reside em, felizmente, ter ido parar às mãos do ‘Chefe’ Pedro Silva, ao
qual estou e estarei eternamente grato por me ter feito ver o que realmente
queria para a minha vida. Na altura, sendo um ciclista que pouco se ouvia
falar, fez de mim o que sou hoje. Venci logo a Prova de Abertura de sub-23 e
esse foi o meu melhor ano, onde ganhei cinco camisolas secundárias, estive
presente no Campeonato da Europa e venci uma etapa da Volta a Portugal do
Futuro. Destaco esse ano como o melhor, porque consegui bons resultados desde a
Abertura até à última prova.”
“Em relação aos melhores resultados,
destaco a camisola da montanha na Volta a Portugal de 2014, a vitória na Volta
a Portugal do Futuro e na última etapa da Volta ao Alentejo em 2013”, numa chegada a Santiago do Cacém e frente
ao norte-americano Chad Haga, actualmente na Giant-Alpecin, terminando em 10º
da geral ganha por Jasper Stuyven, actualmente na Trek. António Carvalho
assinala ainda “o 23º lugar no Campeonato do Mundo em 2011 e a vitória em 2015 do
Grande Prémio JN”. Nesse Mundial de 2011, o 23º lugar teve sabor
especial por ter chegado com o grupo da frente que disputou a vitória agarrada
pelo francês Arnaud Démare (FDJ). “Poderia dizer muitos outros resultados,
pois alguns, mesmo não tendo ganho, souberam a vitória, como a minha primeira
etapa na Volta a Portugal em 2011, onde na chegada a Oliveira do Bairro fiz 3º
atrás de Sérgio Ribeiro e de Francesco Gavazzi.”
No seu
percurso desenhou resultados importantes como a vitória de uma etapa na Volta a Portugal de Juniores. Em 2012 brilhou no 7º lugar na Volta ao
Alentejo, 2º nos Nacionais de fundo ganhos por Manuel Cardoso, 8º no Troféu
Joaquim Agostinho e na Volta a Portugal terminou duas etapas no Top 10. Em 2014
terminou a Vuelta a Castilla y León em 9º e foi 15º na Volta a Portugal, onde
venceu a montanha. Na presente temporada, conquistou o referido Grande Prémio JN, com o triunfo da primeira etapa e da camisola dos pontos, somando ainda o
6º lugar na Volta a Portugal e o 8º no Grande Prémio do Dão. Contudo, António
Carvalho não se mostra totalmente satisfeito.
“Infelizmente, a
temporada não correu como planeei. Foi o ano em que mais me apliquei durante o
defeso com o objectivo de entrar o melhor possível, para depois manter a forma
até Castilla y León, já que tinha feito 9º no ano anterior e estariam muito
boas equipas presentes. Mas o joelho não me permitiu e fui obrigado a parar
para fazer tratamento (visco-suplementação). Agradeço ao Centro Médico da Praça
e ao Dr. Alexandre Brandão pela forma como me receberam e trataram. Depois, foi
começar tudo novamente com uns quilos a mais, que não deviam para altura da época
onde os objectivos da equipa permaneceram iguais… Grande Prémio JN, Campeonato
Nacional e Volta a Portugal. Fui para o JN para dar o melhor de mim, mas principalmente
para preparar melhor o Campeonato Nacional. Acabei por vencer, devido ao enorme
trabalho de toda a equipa. Sem o apoio deles, jamais seria possível. No último
dia, eles estavam mais confiantes do que eu, por isso, esta vitória foi
inteiramente deles e não minha.”
“Em relação à Volta a
Portugal, foi uma alegria enorme ver todo o trabalho de uma época acabar na vitória
do Gustavo Veloso. Foi para isso que todos trabalhámos afincadamente. Durante a
Volta fui ganhando confiança e na etapa que estava estipulada para mim,
Oliveira de Azeméis, acabo por cair já perto do último km e ficar fora da luta
pela vitória. Foi uma sensação inexplicável, um desalento enorme, até as lágrimas
acabaram por escorrer pela cara. Ao final do dia, o Veloso veio ao meu quarto
oferecer uma camisola amarela, onde escreveu algumas palavras e autografou. São
nestes momentos que se vê o que é um líder em vez de um chefe. É uma pessoa
espectacular, do melhor que já convivi numa equipa, onde tenho o prazer de
aprender diariamente para no futuro poder sonhar com algo mais.”
Precisamente
na Volta a Portugal, os companheiros galegos Gustavo Veloso e Delio Fernández assinalaram
inúmeras vezes a qualidade e a forte possibilidade do jovem luso vir a vencer a
geral num futuro próximo. “Há 3 ou 4 anos atrás, diria que isso era impossível.
O ano passado venci a montanha e muitas pessoas disseram-me que podia ter
ficado nos cinco primeiros, caso não tivesse o objectivo da montanha. Este ano,
aproveitei principalmente para aprender com os melhores para tentar vencer a Grandíssima
num futuro próximo. Neste momento sinto que é possível, mas para isso terei que
melhorar ainda mais. Principalmente no contra-relógio, ter o cuidado de ir
analisar tudo ao pormenor, pois este ano nem fui reconhecer o percurso e no dia
acabei por perder alguns segundos devido a isso mesmo. Os erros servem para
aprender, além de ter de treinar mais na 'cabra'. O Gustavo e o Delio estavam
muito fortes, mas acima de tudo foram sempre grandes pessoas e amigos em cima
da bicicleta. Sempre que ajudei, no final agradeciam o trabalho. Até mesmo o
Samuel em Fafe, apesar de ter tido problemas mecânicos que o impossibilitaram
de vencer. Nas alturas certas são esses pequenos gestos de agradecimento que
unem uma equipa e que levam ao sucesso. Nesse aspecto, o Gustavo está de amarelo
tal como acabou a Volta, ele é o nº 1.”
Sobre o
futuro, António Carvalho tem tudo em aberto para 2016. “Apesar de já ter propostas, uma
delas da minha actual equipa W52-Quinta da Lixa, ainda não assinei por nenhuma.
Por isso, não posso adiantar qual vou representar no próximo ano.” Já
em relação aos objectivos a concretizar no ciclismo, tem dois bem definidos. “Irei
trabalhar muito pelo Campeonato Nacional e pela Volta a Portugal. Outros bem
mais complicados, ingressar numa equipa estrangeira e poder estar presente numa
das grandes Voltas. É um sonho cada vez mais distante, pois a idade vai
passando e torna-se cada vez mais complicado. Infelizmente, as equipas
estrangeiras não apostam muito no ciclismo português. Precisamos urgentemente
de uma equipa de 2º escalão, para poder colocar mais facilmente ciclistas no
escalão máximo. Portugal vive dos melhores anos ao ter muitos ciclistas com
muito nível e com qualidade para estarem nessas equipas. Custa-me ver ciclistas
como o Joaquim Silva, pelos resultados que alcançou na Volta a França do Futuro e
Campeonato do Mundo, bem como o Rafael Reis, 4º no Mundial, e mesmo assim estão
em Portugal.”
A realidade
dos números demonstra esta qualidade lusitana. Mas para além dos números, os
ciclistas portugueses revelam uma capacidade incrível de trabalho, dedicação e
luta diária por fazer sempre melhor, destacar os seus pontos fortes e mostrar
que têm valor acima da média para ingressar no pelotão internacional. Portugal
tem hoje um bom número de corredores a correr além-fronteiras, revelando em
cada competição o carácter qualitativo e triunfador como podemos verificar na
recente Vuelta a España.
António
Carvalho é um desses rostos de qualidade internacional, que crescem no pelotão
nacional sonhando com uma merecida oportunidade no estrangeiro. A finalizar a
entrevista, agradeceu “às empresas que estiveram comigo esta temporada,
aos patrocinadores W52-Quinta da Lixa, Cavalinho, CMP e JFSP Oleiros. Muito
obrigado a todos os meus antigos e actuais colegas de equipa e treinadores,
pois se não fosse com a ajuda deles, hoje não estaria onde estou nem conseguia os
resultados que consegui. Agradeço esta entrevista, mas principalmente tudo o que tem
feito por esta modalidade. O ciclismo precisa de pessoas com o seu gosto pelo
ciclismo.”
Obrigada António Carvalho, pela entrevista e por enriqueceres o pelotão de qualidade.
W52-Quinta da Lixa, vencedora da Volta a Portugal 2015 (© Helena Dias) |
Mais uma vez parabéns pela entrevista.Como sempre muito bem escrita e sobretudo porque dá a conhecer episódios das várias etapas da carreira dos ciclistas aos quais é dado pouco relevo. Pelo trabalho que faz na divulgação do ciclismo e dos respectivos ciclistas o obrigado de quem gosta da modalidade
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