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Os velódromos de Portugal


Velódromo de Palhavã (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Em Portugal, o ciclismo já foi considerado o desporto da moda entre as elites. Para chegarmos a esse momento da história, temos de recuar ao tempo da monarquia, até finais do século XIX, para encontrar o primeiro velódromo em território nacional, o Velódromo do Clube de Caçadores do Porto, na Quinta de Salgueiros, não sendo a sua data totalmente precisa, já que a informação a seu respeito é muito escassa. Em alguns relatos, a sua inauguração data de 1883, enquanto noutros data de 1893.

Daqui damos um salto até 24 de Junho de 1894, dia em que foi inaugurado o Velódromo Maria Amélia, no Porto. Mandado construir por D. Carlos I, o rei ‘Diplomata’ autorizou o Real Velo Clube do Porto a construir o velódromo no Paço Real do Porto (ex-Palácio dos Carrancas), cedendo os terrenos para tal. Fundado em 1893, o Real Velo Clube tinha a sua sede no antigo Chalet do Palácio de Cristal e em D. Carlos I o seu presidente honorário. O velódromo era constituído por uma pista macadame, tendo no seu centro dois cortes de lawn-tennise uma bancada em madeira para cerca de 700 pessoas. Após a implantação da República, o velódromo esteve inactivo, sendo reactivado pelo Velo Clube do Porto, em 1915, apenas para actividade local até aos anos 30. Com o passar dos anos, a sua degradação foi inevitável até ao ano de 1940, aquando da instalação do Museu Nacional Soares dos Reis, instituição que promoveu algumas obras de reabilitação tardiamente, em 2001, através da construção dos dois semicírculos nos topos que fechavam a pista. As ruínas deste velódromo podem ser visitadas, por marcação prévia, estando localizadas nas traseiras do Museu.
 
Planta do Velódromo Maria Amélia (© SIPA)

Velódromo Maria Amélia (© Arquivo Plataforma de Cidadania Monárquica)

Ainda durante o seu reinado é inaugurado, a 21 de Junho 1896, o Velódromo D. Carlos, em Algés, que pretendia ser uma construção à imagem do anterior. A planta do projecto a cargo da empresa Mello, Anjos & Companhia, inclui construções de madeira entre a rua de Pedrouços e o velódromo, com a Ribeira e a Ponte de Algés localizadas do seu lado direito.
 
Veódromo D. Carlos (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Planta do Velódromo D. Carlos (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Há também referências, muito escassas, ao Velódromo do Campo do Castelo, em Viana do Castelo. Inaugurado em Agosto de 1899, a sua memória perpetua-se na imagem que retrata a visita de D. Carlos I ao velódromo, acompanhado pelo Infante D. Afonso, para o Concurso de Tiro, em Setembro de 1903.
 
Velódromo do Campo do Castelo (© Lugar do Real)

Já no início do século XX, ainda no reinado de D. Carlos I, é inaugurado a 14 de Maio de 1905 o Velódromo de Palhavã, em Lisboa, devendo-se a sua construção à iniciativa privada de três amantes da modalidade: José Eduardo d’Abreu Loureiro, Fernando Belard da Fonseca e Frederico Carlos Rego. O velódromo ocupava uma parte do antigo Parque de Santa Gertrudes, adquirido em 1957 pela Fundação Calouste Gulbenkian. Para o situarmos melhor, a pista e as bancadas do velódromo estavam localizados onde é hoje a Avenida de Berna. Aos olharmos as imagens da época, podemos constatar a intensidade com que as pessoas viviam os momentos de espectáculo oferecidos no velódromo. Para além da pista, que revestida a cimento podia albergar não só o ciclismo como provas de motociclismo, automobilismo, passando pelo seu recinto concursos hípicos, balões, lançamento de papagaios e até duelos, havia o relvado, as bancadas, a Tribuna Real pomposamente decorada, tendo na frente um coreto de música, e até um restaurante com terraço panorâmico para o velódromo. Ali realizaram-se Festas das Escolas, Festa Académica e até o certame atlético em benefício dos sobreviventes do terramoto na Sicília e na Calábria, em Fevereiro de 1909. Após quase três décadas de existência, o velódromo deu lugar à Feira Popular de Palhavã, em 1943.
 
Numerosa assistência no Velódromo de Palhavã (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Velódromo de Palhavã (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Os concursos hípicos também tinham lugar no Velódromo de Palhavã (© Arquivo Municipal de Lisboa)

A Tribuna Real do Velódromo de Palhavã (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Detalhe dos motivos decorativos da Tribuna Real do Velódromo de Palhavã (© Arquivo Municipal de Lisboa)

O Velódromo de Palhavã era bastante visitado pela sociedade da época (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Velódromo de Palhavã (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Os lançamentos de papagaios no Velódromo de Palhavã (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Velódromo de Palhavã (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Velódromo de Palhavã (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Velódromo de Palhavã (© Arquivo Municipal de Lisboa)
 
Balões no Velódromo de Palhavã (© Arquivo Municipal de Lisboa)

Na época, assim descreveu o repórter da Revista Ilustrada de Portugal e do Estrangeiro, ‘Occidente’, a corrida do Campeonato Nacional, título ganho pelo grande José Bento Pessoa: “ (…) Teve lugar, em 9 do corrente, no Velódromo de Palhavã, a prova anual da União Velocipédica Portuguesa, para disputar o título de campeão ciclista de Portugal. A vitória coube ao Sr. José Bento Pessoa, ciclista experimentado, vencedor em outras corridas de afamados ciclistas. (…) Vai acentuando-se em Lisboa o gosto por estas corridas mais úteis e civilizadoras que as touradas (…). É a evolução do tempo que vai reformando usos e costumes, substituindo-os por outros novos, segundo o pensar e as aspirações da época. Há meia dúzia de anos, ninguém em Portugal pensava nestas e outras diversões do sport e hoje Lisboa já tem um velódromo, que rivaliza com os melhores da Europa, devido à iniciativa particular, à vontade inquebrantável de três entusiastas da velocipedia, os srs. José Eduardo d’Abreu Loureiro, Fernando Belard da Fonseca e Frederico Carlos Rego. O novo velódromo tem pista revestida a cimento com um perímetro de 333,33 metros. As viragens estão estabelecidas de modo que permitem a velocidade de 80 quilómetros à hora. Tem tribuna nas viragens, além da tribuna real que (…) é ampla e muito elegante. Coreto para música em frente da tribuna real. A pelouse nivelada com as rectas da pista. Camarotes e palanques. Os espectadores de pé têm lugar num plano inclinado, que permite a todos desfrutar o espectáculo do mesmo modo (…). Restaurante com terraço onde se pode estar à mesa desfrutando do espectáculo. Enfim, o novo velódromo, a par de todas as comodidades, revela o bom gosto de quem dirigiu a sua construção e dotou a capital com um melhoramento importante como só o têm as grandes cidades da Europa.”
 
Revista Occidente (© Hemeroteca Digital CM Lisboa)

Revista Occidente (© Hemeroteca Digital CM Lisboa)

Por falar nas melhores infraestruturas europeias, daqui damos um salto gigantesco até ao início do século XXI, mais precisamente até Setembro de 2009, data da inauguração do Velódromo Nacional, enraizado em Sangalhos, no município de Anadia. Considerado a obra-prima dos velódromos europeus, é invejado por muitos países amantes do ciclismo de pista. Como já narrámos no site espanhol TrackPiste, este é um projecto inserido no Centro de Alto Rendimento e com assinatura do arquitecto Rui Rosmaninho, seguindo as instruções de Peter Junek, com uma área de 1.100 m2. Um investimento de cerca de 12 milhões de euros, um valor muito longe dos velódromos que o precederam na história velocipédica lusa.

Velódromo Nacional (© Helena Dias)

Velódromo Nacional (© Helena Dias)

Velódromo Nacional (© Helena Dias)



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