João Matias: “Cheguei a bater de porta em porta a pedir dinheiro para comprar uma bicicleta de pista”
João Matias encaminha-se
para o final da sua melhor época, afirmando-se aos 27 anos como um dos mais
fortes sprinters do pelotão nacional. Ao carácter decidido e à qualidade demonstrada
na estrada, onde alcançou a vitória da última etapa no Grande Prémio Nacional 2
e esteve na discussão de etapas na Volta ao Alentejo, no Grande Prémio JN e
Abimota, Troféu Joaquim Agostinho e Volta a Portugal, o corredor da
Vito-Feirense-Blackjack somou uma época de glória em pista. Aos títulos
nacionais em eliminação e perseguição individual, juntou na Alemanha a vitória
em três disciplinas no Dudenhofen International Sprint and Omnium Meeting e o
relevante pódio na disciplina olímpica de madison na Eulen-Renntag Ludwigshafen.
O ano de 2013 marcou a passagem a profissional com a
OFM-Quinta da Lixa, equipa na qual ficou durante três épocas, a última sob a
designação W52-Quinta da Lixa. Em 2016 partiu para Espanha para a equipa
Supermercados Froiz, regressando a Portugal no ano seguinte pela LA
Alumínios-Metalusa. Na presente temporada, vestiu a camisola da
Vito-Feirense-Blackjack.
O Cycling & Thoughts esteve à conversa
com João Matias no Circuito da Malveira, onde foi 4º na estrada e vencedor da prova
de honra na pista.
Temporada de 2018
“Penso que 2018 foi a
minha melhor temporada de sempre. Desde que passei a profissional, com a equipa
OFM não consegui atingir o que queria, depois fui para a Froiz e o ano passado acabou
por ser o renascer com nova ambição para ser um corredor ganhador. O ano
passado ainda não tinha muita confiança em mim, mas os resultados começaram a
falar por si, dei um salto de qualidade e a minha confiança começou a aumentar.
Já este ano discuti muitas corridas e, apesar de só ter uma vitória na última
etapa do Grande Prémio Nacional 2, penso que foi a época mais regular que tive,
tanto na estrada como na pista.”
Avaliação do primeiro
ano da Vito-Feirense-Blackjack
“Penso que as pessoas
de fora vêem a união que temos e a forma como trabalhamos. Fazemos por ter um
bom grupo e por sermos bons companheiros. Para além de companheiros de equipa,
somos muito amigos e, às vezes, isso acaba por ser a chave do sucesso.”
“De início, muita
gente duvidava deste projecto e do plantel que tínhamos, mas felizmente os
patrocinadores, os directores e os nossos apoiantes acabaram por ter confiança
em nós e os resultados estão à vista. Ganhámos a Volta a Madrid, uma corrida
com equipas do WorldTour, e isso foi fruto do trabalho da união do grupo, não apenas
da força individual de cada ciclista. Foi o trabalho de todos e, apesar de
chegarmos à última etapa com poucos ciclistas, penso que estivemos muito bem e
fizemos tanto uma boa Volta a Madrid como também uma boa restante época.”
A vitória de etapa no
Grande Prémio Nacional 2
“Foi muito bom. Quem viu
as imagens na televisão… elas descrevem tudo. Claro que queria vencer mais
cedo, porque a primeira vitória é sempre a que custa mais, mas felizmente ela
chegou e logo numa corrida importante. A vitória até podia ter chegado na etapa
de Sobral de Monte Agraço, no Troféu Joaquim Agostinho, mas não chegou devido a
um descuido meu. Quando olhei para trás nessa chegada, foi aí que perdi a etapa
[foi 2º atrás do campeão francês sub-23 Cyril Barthe, da Euskadi-Murias].”
“Sei que os colegas de
equipa tinham muita confiança em mim, trabalharam todos os dias, e tanto eles
como o director Joaquim Andrade continuaram a acreditar em mim e essa foi a
chave para vencer. Às vezes confiavam mais em mim do que eu próprio.”
“Lembro-me de estar no
Troféu Joaquim Agostinho e ver um vídeo enviado pelos meus colegas. O Luís
Afonso, o Edgar Pinto e o João Santos estavam em estágio na Serra da Estrela e pararam
a meio do treino para ver a chegada. Não eram apenas os ciclistas que estavam
comigo na prova, mas também os que estavam em estágio. Receber essas imagens mostrou
a união do grupo e o quanto eles também queriam essa vitória. Eu tinha que
ganhar principalmente por eles, mas também por mim, por toda a minha família e
por todas as pessoas que me apoiam. Felizmente a vitória chegou e foi bom
vencer no Nacional 2.”
Prestação na Volta a
Portugal
“Nunca escondi que o
meu principal objectivo para a época era tentar ganhar uma etapa na Volta a
Portugal. Estive perto, tanto em Albufeira [foi 8º] como em Viseu [foi 3º]. Na
outra chegada ao sprint, em Portalegre, furei a 1,5 quilómetros e aí fiquei um pouco
frustrado. Em Albufeira, acabei por cometer o erro de arrancar muito cedo para
o sprint, senão podia ter ganho essa etapa ou ter estado mais à frente. Em Viseu
também arranquei um pouco cedo, mas penso que tenho aprendido com esses lugares
que faço perto da vitória e, um dia, quando as coisas começarem a sair melhor
posso ser um ciclista ainda mais regular e ter mais vitórias durante a época.”
Trabalho na Pista a
nível nacional e internacional
“As corridas a nível
nacional são sempre importantes, principalmente o Campeonato Nacional e a Taça
de Portugal, por correr com as cores da equipa e ser importante estar sempre na
luta pela vitória. Felizmente, tenho conseguido. Este ano consegui dois títulos
nacionais, um no ano passado.”
“Mas o principal
objectivo, meu e da Selecção Nacional, é a nível internacional: o apuramento
para os Jogos Olímpicos de 2020. Felizmente, tenho tido sempre a confiança do
seleccionador Gabriel Mendes. O principal é apurarmos Portugal, depois também
penso a nível individual poder lá estar. Vamos tentar o apuramento para omnium
e madison e talvez possamos ter mais de um ciclista nos Jogos.”
“Neste objectivo tenho
estado eu, os gémeos Oliveira, o César Martingil e o Miguel do Rego. Temos
vários ciclistas de categoria e isso tem sido demonstrado. Por exemplo, nesta última
corrida que fiz na Alemanha, os organizadores das provas ficaram um pouco
surpreendidos, porque pensavam que Portugal era só os gémeos Oliveira. Quando
chegámos lá e vencemos, vieram dar os parabéns e disseram que Portugal não é só
os gémeos. Os resultados estão à vista, felizmente tenho tido essa confiança
por parte do seleccionador e quero continuar a lutar e a estar na disputa das
provas internacionais de pista.”
Melhor momento do ano
“A nível individual,
foi a vitória de etapa no Grande Prémio Nacional 2. Foi o coroar de todo o
trabalho da época e a procura da vitória numa corrida importante, uma prova
internacional de categoria UCI. A nível da equipa, foi a vitória da Volta a
Madrid. Apesar de não ser em Portugal e não darem tanto valor aqui, porque não acompanharam
de perto, para nós foi muito bom vencer uma corrida de categoria 2.1.”
Pior momento do ano
“A nível individual
pode ter sido não ter conseguido a vitória na Volta a Portugal, mas não saio
triste da Volta, porque sei que mostrei o meu valor e sei que trabalhei para a
equipa. Na realidade, o pior momento foi a queda do Leonel Coutinho na etapa do
Grande Prémio Abimota. Eu vinha na fuga e quando fui apanhado pelo pelotão só estava
o Xuban e ele disse-me que tinham caído todos os colegas da equipa. Ficámos sem
o Leonel e sem alguns corredores na altura. Lembro-me de chegarem do hospital
ao hotel, cerca das três da manhã, e eu acordei, porque o Leonel estava comigo no
quarto e tive de lhe dar as malas. Ver como o vi foi, sem dúvida alguma, o pior
momento da época.”
Onde procura a
motivação
“Vou buscar a motivação
aos maus momentos que vivi e à confiança que me dão todas as pessoas que estão
perto de mim. Aprendi a viver a vida de maneira diferente e a viver muito
intensamente o ciclismo desde pequenino, mas penso que vou buscar a minha
motivação aos maus momentos que passei na vida, como foi o caso da morte da
minha mãe, o ter estado na equipa OFM sem receber salários durante muito tempo
e depois ficar sem equipa e ter de ir para Espanha.”
“Lembro-me de estar no
Campeonato da Europa ao serviço da Selecção Nacional, em 2016, ano em que estava
na Froiz, e não pensar em nada quando consegui o quinto lugar na prova de
eliminação. Mas assim que acabou a corrida fui para os rolos e, de repente, vieram-me
as lágrimas aos olhos. Veio-me tudo à cabeça, todos os maus momentos, tudo o
que passei caiu-me em cima e aí comecei a pensar que tinha conseguido ser
superior a tudo isso. Na altura, eu ligava às equipas para ver se conseguia um
lugar em Portugal, para voltar a profissional. Depois, passei de ser eu a ligar
para serem as equipas a contactar-me.”
“É aí que vou buscar a
motivação e em todas as pessoas que me apoiaram nos maus momentos. Não só a
família e a namorada, mas também as pessoas da minha terra Roriz, Barcelos,
porque cheguei a bater de porta em porta a pedir dinheiro para comprar uma
bicicleta de pista, para poder fazer corridas internacionais, e tive muita
gente a ajudar-me tanto monetariamente como a dar o apoio. Foi essa a chave de
conseguir dar o salto, virar a minha vida de pernas para o ar e voltar a estar com
muita motivação.”
O que espera alcançar
futuramente no ciclismo
“Todos os ciclistas
profissionais têm a ambição de correr no estrangeiro, fazer grandes provas. Eu penso
que pode ser possível ou não, mas não vivo obcecado com isso. O principal
objectivo é tornar-me um dos melhores sprinters nacionais. Penso que já sou,
mas quero ser ainda mais regular, ter mais vitórias durante a época. Quero fazer
uma carreira bonita, orgulhar-me de chegar ao fim e, quando pendurar a
bicicleta, olhar para trás e pensar que fiz as coisas bem feitas.”
“A longo prazo, o maior
objectivo é o apuramento para os Jogos Olímpicos. Mesmo que eu não esteja nos
Jogos, conseguir ajudar para que Portugal lá esteja será a coisa mais
importante na minha carreira.”
Equipa
Vito-Feirense-Blackjack numa palavra
“Posso dizer várias… união,
amizade. Mas penso que o mais importante é a amizade. Tu viveste pessoalmente os
últimos dias da Volta a Portugal connosco e aquelas brincadeiras que nós temos,
as pequenas apostas dos contra-relógios, tudo isso não é só entre companheiros
de equipa, é mesmo de amigos. Por isso, penso que a palavra amizade é a que
descreve melhor a nossa equipa.”
João Matias - melhores resultados
2018 em Estrada:
1º Et5 GP
Nacional 2
1º *Pontos GP
Nacional 2
1º *Autarquias
Grande Prémio Abimota
2º CG Prova de
Abertura-Região de Aveiro (TLS)
2º Et1 Troféu
Joaquim Agostinho
3º CG Circuito da
Moita
3º Et3 GP
Nacional 2
3º Et5 Volta a
Portugal
4º CG Circuito da
Malveira
4º Et1 Grande
Prémio JN
4º Et2 GP Nacional
2
5º Et3 1ºsector
Grande Prémio JN
5º Et3 Grande
Prémio Abimota
6º CG Volta às
Terras de Santa Maria
7º Et3 Volta ao
Alentejo
8º CG Troféu
Liberty Seguros Elite
8º Et5 Volta ao
Alentejo
8º Et2 Grande
Prémio JN
8º Prólogo Volta
a Portugal
8º Et1 Volta a Portugal
8º Et1 Volta a Portugal
9º Fundo
Campeonato Nacional Elite
14º CG GP
Nacional 2
João Matias - melhores resultados
2018 em Pista:
1º Eliminação –
Campeonato Nacional
1º Perseguição individual
– Campeonato Nacional
1º CG Taça de
Portugal
1º Omnium –
Critério Alves Barbosa / 2ªprova Taça de Portugal
1º Omnium –
Critério Sunlive / 3ªprova Taça de Portugal
1º Scratch – Dudenhofen International Sprint and Omnium Meeting, Alemanha
1º Eliminação – Dudenhofen International Sprint and Omnium Meeting,
Alemanha
1º Corrida por pontos – Dudenhofen International Sprint and Omnium
Meeting, Alemanha
1º Prova de
Honra, Pista – Circuito da Malveira
2º Madison – Eulen-Renntag Ludwigshafen, Alemanha
3º Scratch – Eulen-Renntag Ludwigshafen, Alemanha
4º Corrida por pontos – Campeonato Nacional
4º Madison – International Belgian Track Meeting
4º Omnium – Dudenhofen International Sprint and Omnium Meeting, Alemanha
5º Scratch – Campeonato Nacional
11º Omnium – International Belgian Track Meeting
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