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A Volta é a Volta, não há volta a dar!

A Volta é a Volta e quanto a isso não há volta a dar. Luzes, câmara, acção. Dêem passagem ao colorido pelotão. Esta é a festa do ciclismo e das marcas a si associadas, tanto à prova como às equipas. É a oportunidade maior de visibilidade, completa e televisionada.
 

A Volta a Portugal vai na 84ª edição e, em tantos anos de existência, nunca conseguiu passar indiferente aos amantes de ciclismo. Nacionais ou estrangeiros, os adeptos da modalidade aguardam pela prova rainha lusa com o mesmo entusiasmo e algumas críticas à mistura. Mas assim são os grandes eventos, sempre a despertar paixões exacerbadas e uma multiplicidade de opiniões.
 
O ciclismo é o desporto de proximidade por excelência, que permite o contacto directo com os seus heróis para uma fotografia, uma palavra de ânimo, um pedido de bidon para guardar de recordação. A isto podemos assistir ao longo do ano, mas em particular no dia de visita à Volta a Portugal, na segunda etapa que ligou Abrantes a Vila Franca de Xira com passagem pelo Cartaxo, terra de inúmeros ciclistas profissionais, que escreveram a história do ciclismo nacional, como Alfredo Trindade, José Maria Nicolau, José Marquez, Francisco Valada e Marco Chagas, vencedor de quatro Voltas e comentador da mesma há vários anos na estação pública de televisão RTP, entre outros.
 


Neste dia foram incontáveis os momentos de comunhão entre público e ciclistas. Antes do tiro de partida ou logo após o cruzar de meta, os fãs acercaram-se dos seus ciclistas favoritos, marcando-nos em particular a presença de um menino vestido com uma camisola da Soudal-QuickStep, que fez questão de guardar para recordação futura as fotografias com os seus heróis das bicicletas. É nesta proximidade que se cativam os mais jovens para a prática da modalidade. É, quem sabe, desta forma que não se deixa o ciclismo perder mais adeptos do que aqueles que se foram perdendo ao longo de décadas desde os áureos tempos do mítico e carismático Joaquim Agostinho.




Se para uns a previsibilidade do vencedor é algo que tem vindo a matar a prova nos últimos anos, para outros a vitória quase certa do seu ciclista ou equipa favoritos é que faz a paixão pela corrida aumentar. Um triunfo de equipas portuguesas é dado como certo e incontornável, pairando sempre a dúvida sobre quem será o vencedor.
 
Em 2023, o nome mais falado é, com naturalidade, o do simpático uruguaio Mauricio Moreira, vencedor da edição transacta. Ao contrário do ano passado, o ciclista de 28 anos tem protagonizado uma época de êxitos, contando-se entre eles O Grande Prémio o Jogo e o Troféu Joaquim Agostinho, duas das provas por etapas mais importantes do calendário nacional. Curiosamente é na sua equipa Glassdrive/Q8/Anicolor que encontra os nomes mais falados para poderem suceder-lhe na conquista da camisola amarela.
 

O português Frederico Figueiredo já leva uma vasta experiência na bagagem ao completar este ano a sua 10ª Volta e acalenta o sonho de vencer a prova rainha nacional, fazendo história como o seu tio Carlos Pinho fez, vencedor da montanha e actual mecânico na equipa do sobrinho. O ciclista de 32 anos tem desenhado uma carreira em grande ascensão, tendo já terminado por duas vezes no pódio da Volta, e estando também ele a fazer uma boa época com algumas vitórias. Por outro lado, o recém-chegado à equipa Artem Nych, de 28 anos, vencedor do Grande Prémio Beiras e Serra da Estrela, compôs o pódio do Troféu Joaquim Agostinho com os referidos companheiros, mostrando que está a par da qualidade que impera no reino da Glassdrive/Q8/Anicolor.
 
Olhando às rivais portuguesas há um vasto leque de ciclistas, que já demonstraram capacidade em lutar por um bom resultado na Volta a Portugal: a tríade Henrique Casimiro, Joaquim Silva e Tiago Antunes da Efapel Cycling; Luís Gomes da Kelly-Simoldes-Udo; a dupla Alvaro Trueba e Delio Fernández da AP Hotels and Resorts-Tavira; a dupla Jesus Del Pino e Vicente de Mateos da Aviludo-Louletano-Loulé Concelho; a dupla Luís Fernandes e Hugo Nunes da Rádio Popular-Paredes-Boavista; e António Carvalho da ABTF Betão-Feirense, que cumpriria o sonho de ciclista e equipa, já que o tio Fernando Carvalho ganhou a Volta pelo Feirense em 1990.
 
Uma corrida é uma história por contar, só termina na última linha de meta. O que seria da surpresa se ela não acontecesse? A vida mostra-nos diariamente que tudo pode virar de um momento para o outro. No ciclismo não será diferente. É certo que muitos prognósticos têm sido acertados nos últimos anos, mas a probabilidade de uma vitória inesperada também pode suceder.
 
Veja-se o que aconteceu no ano de 2016, aquando da vitória de Rui Vinhas na 78ª edição. A vitória chegou fruto de uma vantajosa fuga e defesa subsequente da vantagem de tempo adquirida. Não esquecemos o recente processo, que levou ao fim da W52-FC Porto, mas a história é a história e esta foi escrita assim. Uma conquista que calou fundo no coração de muitos gregários que, como Vinhas, trabalharam uma vida inteira em prol dos seus líderes. E também calou fundo na alma portuguesa, que há muito desejava ver um português subir ao mais alto lugar do pódio, feito alcançado anteriormente por Ricardo Mestre, em 2011.
 

Como no Tour, na Vuelta ou no Giro, os candidatos mais fortes estão como que predefinidos, mas até ali, no grande palco do ciclismo internacional, as surpresas existiram e a corrida deu-nos vencedores improváveis. Como naquele ano de 2012 em que o canadiano Ryder Hesjedal agarrou a maglia rosa no Giro de Itália.
 
As equipas, de maior ou menor nível, aguardam com entusiasmo o convite para estarem presentes em mais uma edição da Volta a Portugal, que há uma década é organizada pela empresa Podium. Para os mais desatentos, há que olhar ao alinhamento das formações convidadas e ver que o WorldTour consegue sempre estar presente. Não pelas actuais equipas que o compõem, mas pelos ciclistas que dele já fizeram parte e brilharam ao mais alto nível, bem como pelos jovens que, no futuro, ingressarão nesse desejado mundo. Como exemplo temos  o colombiano Andrés Camilo Ardila, de 24 anos, que esteve três anos na UAE Team Emirates e este ano está ao serviço da Burgos BH. Ou o “lince andaluz” Luis Ángel Maté, que fez grande parte da sua carreira na Cofidis, e corre na equipa com a mais bela e famosa afición do ciclismo, a Euskaltel-Euskadi, estando actualmente a liderar a camisola da montanha. Ambos pedalam na Volta a Portugal, mostrando que a qualidade existe no pelotão.
 

E por falar em juventude, embora seja muito reduzida a lista de ciclistas sub-23 elegíveis para a camisola branca, um total de 10 à quarta etapa, destacamos o português Afonso Eulálio (ABTF Betão-Feirense) e os estreantes na Volta o espanhol Pablo García (Bai-Sicasal-Petro de Luanda), o colombiano David Guavita (Kelly/Simoldes/Udo) e o luso Daniel Dias (Credibom-LA Alumínios-Marcos Car), líder nos três primeiros dias de prova.
 

Para finalizar, muitas são as vezes em que se cai na tentação de comparar a Volta a Portugal à Volta ao Algarve, duas realidades incomparáveis. A segunda é mais globalizante, com o nível e o brilho do WorldTour incorporado, mas que para o comum adepto português, aquele que vive o ano todo à espera da passagem do pelotão pela sua terra, pouco ou nada lhe diz, a não ser quando falamos das equipas com ciclistas portugueses nas suas composições. A primeira é mais tradicional, com os heróis e as equipas aos quais sentem ligação. É por essa razão que a Volta a Portugal continua a ter a importância que tem. Quando chega o tempo dela, em Agosto, mês do regresso dos imigrantes à sua terra natal, ninguém lhe resiste. Até os mais cépticos e críticos saem à rua para ver passar o pelotão ou ficam colados ao ecrã da televisão. Essa é a magia da Portuguesa, chamada assim pelos mais antigos, a Grandíssima para os mais novos.






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