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Giro d'Itália: vitória de Quintana e esplendor de Cardoso

Nairo Quintana (MOV) escreveu uma página inédita na história do ciclismo mundial ao conquistar a primeira Corsa Rosa para a Colômbia. Aos 24 anos, sagrou-se o grande vencedor do 97º Giro d’Itália.

Nairo Quintana vencedor do Giro [by www.gazzetta.it/Giroditalia/2014/it]

Vista como a mais bela das três grandes voltas, o Giro começou na Irlanda com 198 corredores, terminando em Itália reduzido a um pelotão de 156 heróis. Quintana (MOV) conquistou a maglia rosa ao fim de 88h14m32s, deixando o conterrâneo Rigoberto Urán (OPQ) a 2m58s e o italiano Fabio Aru (AST) a 4m04s. O ciclismo escreve-se pelas pedaladas de todos os heróis e a fechar o capítulo do Giro de 2014 esteve o holandês Jetse Bol (BEL), último da geral a 5h15m19s do colombiano.

Na montanha viveu-se uma dura batalha onde Julián Arredondo (TFR) conquistou a maglia azzurra, mais uma para a Colômbia, tendo como principais rivais Dario Cataldo (SKY) e Tim Wellens (LTB). Já na luta pelos pontos, prevaleceram os sprints vitoriosos de Nacer Bouhanni (FDJ) na conquista da maglia rossa perante Giacomo Nizzolo (TFR) e Roberto Ferrari (LAM). Sem surpresa, na juventude imperou uma vez mais Quintana (MOV) no triunfo da maglia bianca, que teve em Fabio Aru (AST), Rafal Majka (TCS) e Wilco Kelderman (BEL) um elenco de luxo nas pedaladas mais jovens, com todos a finalizarem no Top 10 da geral. Por equipas, a AG2R La Mondiale tudo fez para mexer na corrida em diversas etapas e quem sabe obter um triunfo com Domenico Pozzovivo (CG 5º a 6m32s). Essa meta ficou distante, prevalecendo contudo como a esquadra ganhadora diante da Omega Pharma-Quick Step e da Tinkoff-Saxo.

A última semana mostrou-se decisiva no desfecho de todas as classificações e igualmente marcante em momentos controversos, levando a uma mudança prematura na liderança da maglia rosa.

Rigoberto Urán (OPQ) iniciou a 3ª semana envergando a liderança do Giro. A 16ª etapa, apelidada como um verdadeiro pesadelo, ligou Ponte di Legno a Val Martello/Martelltal em 139 km. Além das três portentosas escaladas de Passo Gavia, Stelvio e o final em Val Martello, a dureza climatérica fez-se sentir uma vez mais nesta edição regando a jornada com chuva, neve, neblina e um frio a que só os heróis do asfalto conseguem fazer frente. Entre a dezena em fuga, coroaram as duas montanhas iniciais Robinson Chalapud (COL) o Passo Gavia (km 23,3) e Dario Cataldo (SKY) o Stelvio (km 70,3), seguindo-se uma descida envolta num nevoeiro difícil de decifrar, mas que deu início ao fim do reinado de Urán. Enquanto a Radio Corsa alertava para o perigo da descida, colocando motards com bandeira vermelha a assinalar essa mesma advertência, umas equipas interpretaram-no como uma neutralização enquanto outras não, nomeadamente um trio composto por Quintana (MOV), Pierre Rolland (EUC) e Ryder Hesjedal (GRS), que ganharam vantagem de forma a alcançar o sobrevivente da fuga, Cataldo (SKY), na dureza final de Val Martello e deixando-o para trás já em plena subida. Deste assalto à liderança de Urán (OPQ) resultou a nova liderança de Quintana (MOV) vencendo na meta com 4m11s de vantagem sobre o ex-líder rosa, chegando em 2º Hesjedal (GRS) a 8s e em 3º Rolland (EUC) a 1m13s.

Os directores desportivos dormiram sobre o assunto, acordando porém ainda insatisfeitos com o sucedido no dia anterior e pedindo explicações à organização do Giro, levando ao levantar de dúvidas quanto à realização da 17ª etapa. Após muita conversa e algum esbracejar, o pelotão saiu para os 208 km que ligaram Sarnonico a Vittorio Veneto. Debaixo de uma aparente tranquilidade, o grupo deixou sair em fuga 26 aventureiros, que acabariam por ganhar 15m de vantagem e disputar a etapa entre um quinteto mais resistente. Stefano Pirazzi alcançou a vitória, a terceira da Bardiani-CSF, sobre Wellens (LTB) e McCarthy (TCS).

O tempo voa e depressa chegou a 18ª etapa de 171 km, atacados por uma fuga de 14 logo após a saída em Belluno. A alta montanha esperava os aventureiros, que coroaram Passo San Pellegrino (km 54,5), seguindo-se o Passo del Redebus (km 122,8), onde a guerra da montanha se fez entre Arredondo (TFR), Cataldo (SKY) e Wellens (LTB). A fuga continuou na frente rumo à última ascensão, a 1ª cat. de Rifugio Panarotta com a meta a aguardar o triunfador do dia. No início da derradeira escalada, De Gendt (OPQ) abriu as hostilidades, mas a 16 km do final mostrou ser muito cedo, pois ao longo da subida foi alcançado e ultrapassado pelos companheiros de fuga, conquistando a vitória Arredondo (TFR) a 17s de Duarte (COL) e 37s de Deignan (SKY). No grupo dos favoritos, a Europcar juntamente com a Movistar marcaram sempre o ritmo, sem provocar diferenças entre os primeiros da geral, à excepção de Cadel Evans (BMC), que cairia da 3ª para a 9ª posição.

Envolta em muita expectiva, seguiu-se a crono-escalada da 19ª etapa. De Bassano del Grappa a Cima Grappa, quem seria o mais forte? Com uma pendente máxima de 14% a surgir na parte final do esforço individual, os 26,8 km responderam de forma inequívoca à questão. Quintana (MOV) escalou para a segunda vitória e consolidação da liderança num tempo de 1h05m37s (24,506 km/h). Urán (OPQ) lutou, pedalando o 3º melhor tempo, a 1m26s do seu mais directo rival. Em 2º, numa actuação fulminante e surpreendente, terminou o jovem Aru (AST), somente a 17s.

Restava a derradeira oportunidade de tentar mudar o rumo da história, não tanto a consistente liderança, mas sim os frágeis demais lugares do pódio separados por segundos. A 20ª etapa tinha pela frente 167 km iniciados em Maniago e o final no temível Monte Zoncolan (1ª cat.), passando por Passo del Pura e Sella Razzo. Esperava-se uma autêntica contenda entre os primeiros da geral, mas a realidade foi outra. Da fuga de 19 saiu o pódio da jornada. Michael Rogers (TCS) triunfou pela segunda vez, sendo esta uma conquista especial, já que o Zoncolan é o ‘inferno’ que muitos escaladores não se importariam de ter no palmarés. A 38s terminaria Pellizotti (AND) e a 49s Bongiorno (BAR). Envolto numa impactante maré de Tifosi, o pódio da geral terminou no cume de Zoncolan sem as esperadas diferenças nem muita luta para que tal sucedesse.

No último dia, Gemona del Friuli recebeu o pelotão para os derradeiros 172 km até Trieste. Na 21ª etapa viveu-se a consagração de Nairo Quintana (MOV) como o grande vencedor do Giro d’Itália e a última emoção de um sprint ganho por Luka Mezgec (GIA) diante de Nizzolo (TFR) e Farrar (GRS).

CG 97º Giro d'Itália [by Helena Dias]

Entre os 198 heróis a iniciar o 97º Giro d’Itália, Portugal vibrou com a prestação do único luso em prova… definitivamente, André Cardoso (GRS) não começou com a pedalada direita a estreia na Corsa Rosa. Uma queda impiedosa no contra-relógio por equipas inicial deitou por terra a luta da equipa americana pelo pódio, perdendo logo Dan Martin e Koldo Fernández. A sorte continuou a fugir do português e dos companheiros, que enfrentaram mais quedas nas etapas seguintes, deixando feridas difíceis de superar. Contudo, já em asfalto italiano, André Cardoso foi subindo na geral, deixando para trás os três dígitos e terminando a 2ª semana dentro do Top 30, a par do seu líder Ryder Hesjedal no Top 15. Longe de uma batalha fácil, perderiam ainda Fabian Wegmann, Dylan Van Baarle e Thomas Dekker. Uma Garmin-Sharp de 9 terminaria com 4 guerreiros e uma recuperação extraordinária. Ao 9º lugar de Hesjedal (+13m35s) somaram o 20º de Cardoso (+51m09s), terminando em 104º Nathan Haas (+3h34m24s) e em 147º Tyler Farrar (+4h38m00s).

André Cardoso respondeu na estrada ao porquê de subir ao WorldTour como aposta da Garmin-Sharp. Aos 29 anos somou a 3ª participação numa grande volta, tendo terminado a Vuelta a España em 16º (2013) e 21º (2012). O 20º lugar neste Giro reflectiu não só as qualidades de excelente trepador, bem como a faculdade de ultrapassar psicologicamente as maiores adversidades e manter-se forte no apoio ao seu líder. Entre todas as imagens, jamais se esquecerão duas…
 
André Cardoso na subida do Stelvio [by Ashley Gruber]
Hesjedal e Cardoso na chegada do Monte Zoncolan
[FB Oficial André Cardoso]
Fine del 97º Giro d'Italia........


(escrito em português de acordo com a antiga ortografia)

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